Foi um dia… há algum tempo, ouvia-a como se eu estivesse só no meio da multidão. Não era a sua presença nem o espectáculo que me impediam de ir embora, era o que ainda me tinha para dar sem ela o saber!
Cantou à sua maneira como sempre o fez, e quando terminou, agradeceu e retirou-se. Foi nesse mesmo instante que gritei do meio daquela gente, e implorei-lhe aquilo que mais queria ouvir.
Sem se aperceber de quem o tinha feito, voltou apenas com a noção de que o tinha que realizar. Pegou na guitarra, e quando soltou o primeiro acorde, fechei os olhos para absorver tudo o que ela me estava a oferecer…
Geme o restolho, triste e solitário
a embalar a noite escura e fria
e a perder-se no olhar da ventania
que canta ao tom do velho campanário.
Geme o restolho, preso de saudade
esquecido, enlouquecido, dominado
escondido entre as sombras do montado
sem forças e sem cor e sem vontade.
Geme o restolho, a transpirar de chuva
nos campos que a ceifeira mutilou
dormindo em velhos sonhos que sonhou
na alma a mágoa enorme, intensa, aguda.
Mas é preciso morrer e nascer de novo
semear no pó e voltar a colher
há que ser trigo, depois ser restolho
há que penar para aprender a viver.
e a vida não é existir sem mais nada
a vida não é dia sim, dia não
é feita em cada entrega alucinada
prá receber daquilo que aumenta o coração.
Geme o restolho, a transpirar de chuva
nos campos que a ceifeira mutilou
dormindo em velhos sonhos que sonhou
na alma a mágoa enorme, intensa, aguda.
Mas é preciso morrer e nascer de novo
semear no pó e voltar a colher
há que ser trigo, depois ser restolho
é preciso penar para aprender a viver.
e a vida não é existir sem mais nada
a vida não é dia sim, dia não
é feita em cada entrega alucinada
prá receber daquilo que aumenta o coração.
Mafalda Veiga